10 janeiro 2007

Histórias da Minha Vida Profissional

Ando a morrer de saudades de trabalhar em hotelaria. Mais do que um emprego aquilo transforma-se num modo de vida. Tenho saudades das cozinhas dos hotéis. Adoro ver os tachos gigantes, as obras de arte dos cozinheiros gourmet, poder provar todos os ingredientes, ver sair, em 15 minutos e pelas mãos de dezenas de empregados de mesa, 500 pratos para um banquete…tenho tantas saudades.

Tenho muitas saudades também de Chefes Executivos gordos e muito abrutalhados que gritam 8 horas por dia para pôr uma cozinha a funcionar. Sempre me dei bem com os Chefes de Cozinha. Principalmente com um alemão de um metro e noventa de altura e com uma barriga provavelmente da mesma dimensão. O senhor estava determinado em pôr-me na engorda. Sempre que ia à cozinha, tinha que provar qualquer coisa que ele estava a preparar. Quando gritava comigo porque tinha feito asneiras (entre outras coisas eu era coordenadora de catering), agarrava-me pelo braço, empurrava-me para dentro do frigorífico com ele e dava-me um gelado. Um pedido de desculpa pelos decibéis a que tinha sujeitado os meus ouvidos. Quando trabalhava pela noite dentro e ele me via cansada, vinha ter comigo com uma goluseima. Chegava-se perto de mim – felizmente não muito perto porque a barriga não o permitia – e, com os dedos gordos, punha-me as franjas atrás da orelha. Quando me via durante a tarde a vir da cantina com uma lata de Coca-Cola Light na mão, agarrava-me pelo pulso e dizia-me que se eu continuasse a beber daquilo, nunca mais engordava!!! Chamava-me sempre à cozinha quando estava a fazer pratos exóticos: puré de batata roxa do Chile, carne de gazela da África do Sul, folhados de espargos com molho bechamel…

No dia em que vim embora, deixei as últimas despedidas para a cozinha. Deparei-me com um senhor grandalhão muito emocionado porque nunca mais íamos trabalhar juntos e porque nunca mais podíamos ter conversas sobre comidas do mundo e sobre os países todos onde ele tinha trabalhado. Deu-me um abraço com tanta força que eu senti-me sufocar naquela barriga gigantesca.

Partir tem destas coisas. Deixa muitas histórias para recordar. E eu gosto muito de me lembrar das pessoas que gostei de conhecer. Principalmente das que me dão de comer e acham que preciso de engordar.

8 comentários:

tamagoxi disse...

é uma estoira muito bonita
obrigado por partilhares

Anónimo disse...

Sei que pode parecer história, mas eu sei bem o que isso é.
Trabalhei muitos anos (toda a minha adolescência) num hotel, inclusive, morei toda a minha adolescência num hotel.
Trabalhei no bar, no restaurante, pouco na recepção, na copa, na lavandaria, na cozinha (adoro fazer tapas e entradas).
Conheci e fiz amigos de todo o mundo, da Suécia à Nova Zelândia.
Um dia disse basta, mas ainda hoje penso em voltar.

Anónimo disse...

Por muita coisa que tenha feito na vida, nenhuma proporciona a felicidade de sentir o sorriso de um cliente que viajou 5000 km e se sente em casa.

Cláudia disse...

Eu um dia também disse basta. Era tanto trabalho, tanto stress, tanto abuso de clientes que sem problemas nos insultam e gritam, que eu pensei que não aguentava mais. Mas agora acho que até tinha estofo para aquilo e tenho saudades. E ainda tenho guardada uma carta de um cliente a agradecer-me pelo que fiz por ela. E sabem bem estas coisas.

Anónimo disse...

Cláu, desde que foste "fazer-te à vida" por esse mundo que embarcaste numa viagem sem retorno - as saudades. Vais tê-las e vais deixá-las sempre. Cá ou lá.
Gosto muito de te ter cá!

Anónimo disse...

E mais, mana pequena: o teu blog está cada vez melhor.

Anónimo disse...

Portugal só tem a perder se te fores embora... não vás, sim?

Dá mais um voto de confiança ao nosso Portugal e conta comigo, afinal estamos mm ao lado uma da outra ;)

Sofia

Anónimo disse...

Portugal só tem a perder se te fores embora... não vás, sim?

Dá mais um voto de confiança ao nosso Portugal e conta comigo, afinal estamos mm ao lado uma da outra ;)

Sofia