03 janeiro 2007

Crónica Lucian Freud

Crónica inspirada no texto de Tiago Araújo de 2 de Janeiro, no blog através dos espelhos, sobre Lucian Freud.

Recordo-me bem de quando ia passar fins-de-semana a casa da minha tia em Bruxelas, era ainda adolescente. Ela e o marido colecionam arte e eu passava horas a olhar para os quadros pendurados nas paredes. Sentia-me muito intimidada pela carpete branca que eu acabava sempre por sujar com a terra que trazia nas sapatilhas, com a formalidade com que serviam chá e bolachas à tarde, com o abacate e camarões servidos como entrada ao jantar e com as trufas de chocolate servidas com o café.

Quando nos sentavamos no sofá da sala, ficava muito desconfortável com os dois quadros na parede em frente, de duas senhoras nuas, em poses muito graciosas. Incomodava-me a ideia de ter duas mulheres nuas a observar a nossa conversa. Era muito dificil para mim entender que aqueles dois senhores, mais velhos ainda que a minha mãe, gostassem de quadros com pessoas sem roupa. Lembro-me de pensar que nunca faria tal coisa em minha casa.

Incomodava-me a nudez nos quadros. Da mesma forma que durante muito tempo me incomodou olhar para um homem sem roupa. Achava-os desagradáveis à vista e pouco elegantes. Talvez me incomodasse menos a nudez versão hollywood, fabricada e pouco natural.

Mas agora estou diferente e dá-me prazer olhar para quadros como este. Vejo histórias de amor ou de deleite. Vejo gente que tirou prazer do corpo de outra ou gente que sofre e é vulnerável. Vejo muito mais do que um corpo nu.

No quarto da estalagem, encostado à janela a fumar um cigarro, perguntou-me porque é que estava a olhar. E eu respondi: Porque me dá prazer.

6 comentários:

Anónimo disse...

Não gosto particularmente dos trabalhos do Lucian Freud, prefiro sem dúvida as conversas com o teu sobrinho, mas o texto está incrível.
Parabéns.

Ivar C disse...

olha, desculpa lá o abuso de confiança, mas passei-te um TPC lá no "não compreendo". ;)

Anónimo disse...

Excelente post, maninha. Gostei!

Anónimo disse...

Gostei do post e gosto muito do Lucian Freud. A nudez incomoda, especialmente a mais realista, de corpos de pessoas normais. Sentir-me-ia pouco à vontade se pendurasse na parede da minha sala «L'Origine du Monde», de Courbet, e convidasse os meus pais para jantar.

Anónimo disse...

Estava com curiosidade em ver como começarias o ano, e acho que começaste da melhor maneira. Pessoalmente a nudez nunca me incomodou. Talvez porque o corpo sempre foi tratado de uma forma muito informal entre os meus.

Bom ano.

Cláudia disse...

Tiago: Vi esse quadro em Paris se não estou enganada. Fiquei tanto tempo a olhar para ele. Mas de facto não o queria na minha sala de jantar. Nem em qq outra parte da casa.

cremasterbragança: A mim incomodava e já era bem "grandinha" quando deixou de incomodar. Deve ser porque porque tive uma educação um bocadinho conservadora.

Bagaço Amarelo: Sábado cá estárá o post que me deste como TPC.